terça-feira, 10 de julho de 2012

Querido, com a língua não?!


Doralice e Neves estavam casados há quase dez anos. Ele, professor universitário, doutor em Linguística. Ela, revisora de textos na redação de um importante jornal. Tinham um relacionamento daqueles que beiram a perfeição. Invejável. Gostavam muito de viajar, conhecer novos lugares, novas culturas. Frequentavam bons restaurantes. Adoravam música, cinema, teatro. Devoravam livros e mais livros. Assunto era o que não faltava para eles. No entanto, há tempos o sexo vivia naquela pasmaceira. Não era de hoje que precisavam dar uma apimentada nesse quesito.
— Ai Neves, meu amor. Eu não vou conseguir.
— Vai sim, Dorinha. Não custa nada tentar, vai?!
— Pra você é tudo muito simples. Mas isso vai de encontro a tudo aquilo que prego diariamente. Fere profundamente os meus princípios. Brincadeiras com a língua, eu não admito.
— Poxa, querida, entre quatro paredes, vale tudo!
Apesar da insistência de Neves, Doralice mais uma vez colocou mil obstáculos e não conseguiu realizar suas ideias sexuais mais recentes.
No dia seguinte, durante a sessão da terapia, a revisora comentou com a sua analista:
— Agora mais essa, Doutora. O Neves cismou com essa história. Insiste o tempo todo nessa maluquice.
— Relaxa, Doralice. Essa necessidade de associar dor e prazer é muito comum entre os casais. Tente trazer isso de forma benéfica ao seu relacionamento.
Doralice pensou no assunto o dia inteiro. Durante o almoço, decidiu comentar com Marluce, sua melhor amiga, que, como de costume, foi muito prática e objetiva:
— Ô Dora, pelo amor de Deus, né? Faz logo isso, criatura. Porque se você não faz, vem outra e faz. Aí, eu quero ver!
— Será, amiga? Será que ele é capaz de me trair por causa disso?
— Vai pagar pra ver? Vai?
A ideia ficou rondando sua cabeça o dia inteiro. Para ela, não era realmente simples. Não se imaginava naquela situação. Porém, não via muita saída. Precisava testar. Agradar o maridão.
— Alô, querido. Sou eu, Dorinha. Já está em casa? Então se prepara que hoje vai rolar.
—Hmmm. Pode deixar comigo. Você não vai se arrepender, meu amor.
Doralice chegou em casa, tomou um banho bem refrescante. Passou um óleo perfumado pelo corpo inteiro e vestiu uma camisola de seda, bem sensual. Foi para o quarto e encontrou com o Neves, que já estava deitado, esperando. Ela amarrou as mãos do marido na cabeceira da cama com lenços e ameaçou:
— É dor o que você quer sentir, meu amor? Não é?
— É sim, minha delicinha. Acaba comigo, vai?
A mulher ficou em pé sobre a cama, por cima das pernas do Neves, e quando começou a baixar a alça da camisola, falou:
— Então fica quietinho pra mim começar a tortura!
Quando o Neves percebeu o que sua mulher era capaz de fazer, ficou imediatamente excitado. A Doralice foi perdendo a vergonha, ficando cada vez mais ousada, voluptuosa, a ponto de ser capaz de gritar em seu ouvido:
— “Mendingo”, “mortandela”, “salchicha”, “rezistro”!
— Isso meu amor, assim você me enlouquece — dizia o Neves, enquanto se contorcia todo sobre o colchão.
A cada erro de concordância nominal, ou de regência verbal, ou de emprego de pronome, que sua mulher cometia ao seu ouvido, ele entrava em êxtase. Mal sabia ele que o pior – ou o melhor, quem sabe? – ainda estava por vir.
Doralice, já completamente nua, se debruçou sobre o corpo do marido e mandou o golpe mais poderoso, a tacada fatal, sussurrando ao pé do ouvido do Neves:
— Tá gostando, meu amor, ou prefere que eu “seje menas” violenta?
Ao ouvir isso, o Neves não se conteve de tanto prazer, puxou os braços com toda força, arrebentou os lenços que o prendiam à cama, e foi pra cima da Doralice com um furor sem precedentes.
Naquela noite, os dois se amaram como nunca. E a Doralice só se arrependeu de não ter cedido às loucuras do marido há mais tempo. Santa língua portuguesa!

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